Desculpe-me, Amy.



Difícil dizer, mas acho que faço o que faço profissionalmente porque sou assim: gosto de olhar para os fatos consolidados no tempo. Minha profissão exige isso. Talvez a segurança venha pela sensação de que não podem mais fugir ao meu controle, embora eu também não possa mais, em muitos casos, absorver toda a integridade e a verdade desses acontecimentos passados. Isso repercute em mim, pois torna maior o desafio de correr riscos.
No campo musical não sou diferente. Demoro mais do que a maioria para gostar de determinado cantor ou música na grande parte das vezes. De plano, não gosto, mas depois passo a gostar. Maluco? Não sei. Talvez isso se deva por estar aberto a influências externas. Muitas vezes começo a ouvir a partir da experiência musical da minha família, afinal, especialmente os filhos estão sempre acelerados nesse campo. A influência de filmes, amigos assoviando ou o som que toca na academia na hora do treino também contam. Muito. O devagar nesse ponto sou eu mesmo, embora tenha uma legião de músicas e intérpretes que aprecio desde a infância.
A maturidade dos intérpretes também conta nessa evolução. Lady Gaga, não podia nem poder ouvir o nome quando se apresentava apenas com aquelas roupas malucas e com clipes estranhos para um velhinho como eu. Há um tempo ouvi que ela havia tido problemas pessoais sérios que a tinham afetado e que estava superando. Pronto, a empatia começou a acontecer. Depois, ela vem e lança "Milion Reasons", com aquela suavidade inicial e toda aquela intensidade vocal que vem depois. Resultado, lá vou eu fazer uma releitura da artista, agora com um visual maduro, elegante, sóbrio e lindo.
Com Amy Winehouse foi a partir do documentário "Amy" (Direção: Asif Kapadia), quando passou a ser exibido pelo Netflix. Ver aquele ser humano evoluindo como intérprete ao tempo que se degradava como pessoa mexeu com meu senso musical. Quanto ela morreu, eu senti muito mais por ter perdido como perdeu para as drogas e pela situação de desrespeito que a imprensa mostrava com sua situação. No entanto, a partir do documentário, meus ouvidos se apuraram para a grande intérprete e compositora. Que voz o mundo perdeu precocemente, aliás, como Janis Joplin, por motivo semelhante (!), mas essa eu sempre adorei os vocais gritados e maravilhosos.
A cada música que ouço me surpreendo com a Amy e a pergunta que me vem à cabeça é sempre "como não a salvaram?". Sei que não posso julgar ninguém. Fica apenas esse sentimento estranho e uma pontada de arrependimento por ter demorado tanto para apreciar essa joia musical.
Esse processo talvez me deixe mais aberto, pois, apesar das cantoras citadas, não tenho preferência musical estrita. Aprendo a curtir vários gêneros, nacionais e internacionais. Preciso apenas de tempo.
Mas, enfim, desculpe-me, Amy.