A vingança



Quando eu era pequeno, lembro-me de ter medo de homens de barba. Sei lá o porquê disso, mas tinha. Era ver um amigo dos meus pais ou parente com barba e lá desatava o guri a chorar, colocando meus genitores em estado de puro constrangimento.
Atualmente, em Sagrada Barba Barbearia
Na adolescência, minhas lembranças me dizem que aos quatorze anos retirei os primeiros vestígios de bigode, o que fiz "pegando" emprestado o "duas lâminas" do meu pai. Talvez a memória dos primeiros anos de vida clamassem por uma resposta à altura: "retirarás todo o pelo do rosto". Ao invés de perguntar pro velho sobre a "parada", parti logo para a execução e sinceramente não sei como algo não deu errado e não me cortei.
Passados os anos, juventude e idade adulta vieram, e o ritual se repetia, às vezes diariamente, o que convenhamos é um exercício de disciplina e tanto, na maioria das vezes imposto por questões profissionais, afinal, certas pessoas que formam as instituições insistem em impor o próprio gosto aos funcionários, em total desrespeito à liberdade de cada um.
As poucas vezes em que deixava crescer, limitaram-se a períodos de férias, quando eu admitia o cultivo por 4 a 7 dias.
Há cerca de ano e meio mais ou menos, enquanto participava do movimento grevista sobre o qual já falei aqui, confesso que por comodidade, fiquei um período a mais sem fazer, olhei no espelho e pensei: "Dá para aguentar". Os dias passaram e lá fui sustentando.
A vingança da barba estava apenas começando, pois esposa e filhos aprovaram o início do novo visual e começaram a dar sugestões que tornavam cada vez mais aceitável em minha mente um passo mais sério, afinal, o velho estava entrando na moda.
A danada, como se consciente de que seu momento chegara, foi ficando e parecia cada dia mais graciosa. Um belo dia senti como se ela jamais tivesse sido excluída da minha vida antes. Foi a hora em que percebi que não dava para ficar improvisando e tinha que buscar ajuda profissional.
Apesar de todo o cuidado, chegaram a perguntar, em tom de brincadeira disfarçada, se barba era coisa de vagabundo, ao que respondi que se aparar constantemente, lavar todos os dias, hidratar e passar outros produtos ao menos semanalmente fosse coisa de vagabundo, eu disse que sim e que requeria tanto cuidado quanto raspar.
Diferentemente, muitas pessoas aprovaram o visual, alguns amigos confessando que gostariam de cultivar, mas não o faziam por diversas razões.
2012
Para mim, o que importa realmente é que tenho me sentido bem de barba a ponto de ter que recorrer a fotos para lembrar como eu era sem ela, como se a usasse a vida toda.
Não sei até quando ficarei assim e não penso nisso: já vi que não dá. O que importa é o agora.